domingo, 14 de junho de 2009

"Diário de Bordo": "Casal Aventura" vai ao vulcão El Mocho e faz tirolesa

Vulcão El Mocho e uma vista maravilhosa

Acordamos cedo para o café da manhã e para esperar Marcelo Monroy que irá nos levar a um passeio de pick-up 4x4 até o vulcão.

O café da manhã é outro show à parte, a água caindo na fachada do hotel, o cheirinho de café fresco, o bosque ao redor, o pãozinho quente, as frutas, os diversos tipos de bolos, tudo elaborado para o seu prazer. Assim que terminamos o café da manhã fomos ao mini-golf e pontualmente às 9h30 Marcelo Monroy nos pega no saguão do hotel.

Flávio Prado/Folha Imagem
Árvore caída sobre a estrada da reserva Huilo Huilo, nas terras chilenas
Árvore caída sobre a estrada da reserva Huilo Huilo, nas terras chilenas

Já no início da exploração 4x4 percebemos não se tratar de um simples passeio. Ninguém melhor que um integrante da família Monroy para nos apresentar a magnitude da Reserva Huilo Huilo. Vamos pelas estradas de terra até alcançarmos a entrada da reserva, controlada por Don Alfredo. Esta é uma entrada utilizada pelos funcionários da reserva. Nossa aventura começa ao atravessarmos a ponte. Marcelo vai subindo com a pick-up e nos dando detalhes da reserva quando pára na estreita e sinuosa estrada de terra para nos mostrar uma árvore que caiu estrategicamente de um barranco e parou na beirada da estrada, formando assim um portal por onde se passa por baixo. Mágico, não? Até nestes detalhes a reserva se mostra de fato encantada.

Flávio Prado/Folha Imagem
Estrada estreita dentro da reserva Huilo Huilo, em território chileno
Estrada estreita dentro da reserva Huilo Huilo, em território chileno

Vamos seguindo pelo caminho principal até o mirante de uma tirolesa de 90m de altura. Marcelo nos explica que existe um circuito bastante amplo de tirolesas que começam em um setor do bosque chamado de Selva Valdívia com 3m de altura, tirolesa infantil, passando para 35m, dificuldade média, Canopy Huilo Huilo e 90m no Bosque Húmedo Templado, que é onde estamos agora. Para a montagem de todas as tirolesas foram usados equipamentos franceses e cabos de 1,2 polegadas, quando o exigido são 0,9 polegadas, com durabilidade de 12 anos. A reserva prefere utilizar um cabo acima das especificações ISO para garantir maior segurança aos usuários.

Tudo é absolutamente cuidado e monitorado por rádio na Reserva Huilo Huilo, só se fazem as trilhas acompanhados por no mínimo um guia que sempre está munido de rádio e kit de primeiros socorros. A estrada é estreitíssima e apenas um carro passa por vez, para tal é necessário haver muita ordem e sincronicidade. Existe a possibilidade de algum turista dirigir seu próprio veículo 4x4 em direção ao vulcão, mas este deve estar acompanhado de um guia com rádio.

Flávio Prado/Folha Imagem
Marcelo Monroy e Maira observam a vista a caminho do topo do vulcão Choshuenco
Marcelo Monroy e Maira observam a vista a caminho do topo do vulcão Choshuenco

A velocidade máxima dentro da Reserva Huilo Huilo é de 40Km/h e todos os veículos devem cumprir as normas de circulação legais de emissão de gases tóxicos, escapamento com silenciador, freios e luzes em bom estado etc. O acesso de motos é restrito, pois o barulho deste tipo de veículo perturba a fauna da reserva. Também não é permitido o ingresso de animais domésticos na reserva, devido aos danos que os mesmos podem causar à flora e fauna.

Para as trilhas a pé e caminhadas a mesma regra é válida, ninguém pode andar sem um guia equipado com rádio e primeiros socorros. Imaginem que existem caminhadas com duração de 9 horas e isto é impossível sem um guia que conheça a região.

Nem tente fazer nada sozinho, é desastre na certa. Toda a magnífica região é repleta de penhascos, rios, rochas vulcânicas, saltos de água, árvores gigantescas e centenárias. Imaginem que muitas vezes você anda e vê o que pensa ser simples arbustos, mas na realidade são copas de árvores, você sobe a montanha sem perceber. Seja sensato, esta não é a sua praia, então respeite o trabalho de quem conhece a região.

Sempre subindo em direção às neves eternas do Vulcão El Mocho, o mais perigoso de todo o Chile, pois sua cratera está totalmente encoberta de neve, o que o transforma em uma panela de pressão, começamos a perceber na encosta incríveis formações de rochas basálticas e a própria vegetação começa a se vestir do que chamam de "barba de velho", um líquen que só aparece em locais com 80% de ar puro. Um bosque de grande variedade de espécies dá espaço a centenárias lengas e "barbas de viejo" encobrindo as copas das árvores, neste ponto temos uma preciosa vista do Vale Neltume entre os lagos e o cordão montanhoso.

Flávio Prado/Folha Imagem
Maira no vulcão Choshuenco, considerado um dos mais perigosos do Chile
Maira no vulcão Choshuenco, considerado um dos mais perigosos do Chile

A reserva é cortada pelo Lago Pirehueico, que é o lago mais puro do Chile, este lago se bifurca em diversos braços formando uma infinidade de pequenos rios.

Impressionados com a altura que estamos, observamos que o terreno fica cada vez mais escasso em vegetação e o solo coberto por pequenas rochas vulcânicas negras.

Estamos em um outro mundo, as nuvens nos acariciam e os vulcões nos vigiam. Marcelo Monroy pára a pick-up em uma das encostas do vulcão e nos dá um presente muito especial ao nos apresentar aos 11 vulcões e cinco lagos à nossa volta. São eles: Vulcão Villa Rica, o mais ativo do Chile, El Lanín, Quetrupillán, Choshuenco, Lonquimay, Osorno, Puntiagudo, Descabezado, Tronador, Llaima e a linda Cordilheira del Encanto. Marcelo ia falando os nomes dos vulcões e cada vez mais eu o ouvia longe e com eco, fui arrebatada pela maior força da Terra, a natureza.

A natureza aqui é tão enlouquecedoramente direta que comecei a chorar. Não consegui identificar se eu estava emocionada por me sentir tão grande, com o espírito imenso sabendo que eu também faço parte de tudo isto, ou se eu me sentia pequena ante toda esta magnitude e logo me lembrava que não sou pequena porque sou do tamanho do universo. É engraçado, você sente exatamente como se uma redondilha literária passasse de um neurônio a outro, um pensamento vem, logo é encoberto por outro contrário e assim vai, é confuso, mas te trás uma força renovadora.

Nunca vou me esquecer deste momento, do brilho nos olhos de Flávio e Marcelo, da energia poderosa que nos envolvia. Ficamos mais alguns minutos observando emocionados e entramos na pick-up para subir um pouco mais.

Subindo até a cratera encoberta por neve, deixamos a pick-up um pouco mais abaixo e ascendemos para andar na neve e observar os gigantescos paredões basálticos à nossa volta. No degelo as placas de gelo vão descendo montanha abaixo vincando este paredão que preserva as marcas deste tipo de erosão.

Flávio Prado/Folha Imagem
Estrada de rocha vulcânica que dá acesso ao topo do vulcão Choshuenco, no Chile
Estrada de rocha vulcânica que dá acesso ao topo do vulcão Choshuenco, no Chile

Imaginem poder esquiar em um vulcão, é isto que acontece aqui. No verão existe a possibilidade de descer a montanha esquiando. Agora há pouca neve e aqui em cima temos apenas a máquina para andar na neve em dias de nevascas. O inverno é tão intenso que há mais ou menos 12km para frente da reserva a neve já começa com 40/50cm de altura.

Em julho de 2005 nevou 5 dias seguidos e não se podia subir enquanto a neve não parou de cair, a temperatura caiu a menos 30oC. Aqui em cima é quase impossível chegar no inverno, muitas vezes ficam-se semanas sem se subir ao Mocho, devido às fortes nevascas. A temporada de verão vai de 1 de novembro à 31 de março com trinta e cinco atividades por toda a reserva.

Voltamos à pick-up e Marcelo nos conduz vulcão abaixo nos mostrando o trajeto de um dos trekkings ao vulcão. Vamos descendo e Marcelo o tempo inteiro vai se comunicando com outros guias por rádio, passando horários e previsões de passagens em determinados trechos da montanha.

Por que tudo isto? Como já disse antes a estrada é muito estreita e em pouquíssimos pontos da montanha pode-se passar dois carros ao mesmo tempo, então toda a comunicação por rádio é justamente para que a sincronicidade seja perfeita entre todos os guias que estão na montanha. E foi exatamente o que aconteceu conosco, vínhamos descendo e neste trecho mais largo nos encontramos com outra pick-up 4x4 com um casal e um guia, Marcelo Monroy passa todas as últimas coordenadas sobre o tempo e algo na trilha que ele tenha visto e todos seguem seu caminho.

É assim que eu gosto organização e controle, afinal estamos diante de uma força natural imensa, então tudo deve ser muito bem planejado para que coisas desagradáveis não aconteçam, minimizando os riscos todo mundo ganha. Outro fato importante é que os guias que estejam em caminhadas ou nas tirolesas estejam cientes de tudo o que está acontecendo na Reserva Huilo Huilo.

Voltamos para o hotel já com hora marcada para a próxima aventura.

Tirolesa de 35m de altura

Fazemos uma caminhada rápida pelo bosque ao redor do hotel Montaña Mágica e logo retornamos para mais uma vez descarregarmos a máquina digital em nosso notebook, cedido pela Lenovo. Fica aqui um grande agradecimento, pois por diversas vezes apenas o notebook nos salvou, porque você se empolga tanto que fotografa absolutamente tudo, já na descida do El Mocho descarregamos as fotos e agora mais uma vez. Com absoluto respeito a todos os lugares que já estivemos aqui no Chile ou ainda estaremos, acredito que nenhum deles poderá se comparar à Reserva Huilo Huilo e ao inusitado Hotel Montaña Mágica Lodge.

Flávio Prado/Folha Imagem
Maira já preparada para enfrentar uma tirolesa de 35 metros de altura
Maira já preparada para enfrentar uma tirolesa de 35 metros de altura

Enquanto estávamos no saguão descarregando as fotos e aguardando Marcelo; Rody Jevenes, o simpático recepcionista, nos apresenta Felipe Garcia, o administrador do Montaña Mágica, que nos fala um pouco mais sobre a região e seus encantos. Por volta das 14h Marcelo Monroy chega para o meu grande desafia de hoje: a tirolesa de 35m. Todo mundo está achando lindo, só eu é que estou estressada, não consigo relaxar. Vou tentar, mas tenho muito pânico de altura. Só para vocês terem uma ínfima idéia morei em um apartamento no 14o para ver se rompia este pânico e parece que deu certo, pois hoje só moro em andares altos e adoro. Vamos ver como me comportarei nesta experiência.

Vamos de carro e passamos pela tirolesa infantil, mas como eu estava nervosa nem prestei muita atenção. Encontramos-nos em uma das bases dos guias com Macarena, Felipe e outros guias. Pegamos os equipamentos e lá fomos nós de pick-up. Até aqui, tudo bem.

A pick-up pára na estrada e nós seguimos a pé por um caminho curto entre as árvores até algo que se parece com um abrigo. Não percebi que estávamos em uma construção em cima de uma copa de uma árvore de mais de 40m de altura. Vesti os equipamentos já preocupada e com uma certa tremedeira interior, mas vamos lá eu disse para mim mesma. Começaram as explicações e percebi que estava ficando um pouco gelada, tudo bem, vamos tentar, afinal quero tentar vencer isto. Mostram-me os engates e como devo ir prendendo-os para atravessar a ponte.

Tudo bem, mas alguma coisa em mim já estava sacando que o corpo estava parando de obedecer a minha vontade. Tudo bem, respirei fundo, prestei atenção e lá fui eu atravessando a ponte de madeira presa por cabos de aço. Chegamos de fato, à primeira base de lançamento. Nosso guia vai primeiro, Flávio é o próximo e parece estar curtindo demais, seus olhos brilham e ele ao se lançar ainda olha para os lados para observar a paisagem e eu fiquei observando ele ir e os cabelos dele balançando fora do capacete.

Macarena me prepara e como sabe que estou super apavorada, vai fazer a tirolesa dupla. Já estou engatada ao cabo de aço, em cima da plataforma, mas quem disse que sou capaz de mexer um único músculo? Travei totalmente, não conseguia nem ao menos falar. A minha voz ficou grossa e baixa, que pânico, que gelo correndo em minha corrente sangüínea, que sensação péssima.

Macarena avisa os outros guias por rádio e um deles retorna para me ajudar e ver o meu nível de pavor. Conclui-se que é impossível que eu vá, afinal eu estava com a cor de um cadáver e chorando. Macarena me leva até o abrigo, atravesso a ponte de novo, o pavor é tão grande que parece que os músculos do corpo não obedecem nada. Infelizmente eu não soube lidar com esta situação, mas aqui ficam duas questões: uma delas é que ao chegar na beirada de uma plataforma de 35m de altura já venci um monstro em minha mente e o outro ponto é que tenho certeza absoluta que da próxima vez vou conseguir exorcizar esse medo maldoso que distorce a realidade.

É incrível, você sabe que está equipada e presa, ou seja, não vai cair, não tem como não funcionar bem, mas a cabeça é conduzida pela loucura do medo.

Flávio Prado/Folha Imagem
Macarena e Flávio preparados para o início do primeiro trecho da tirolesa
Macarena e Flávio preparados para o início do primeiro trecho da tirolesa

Alguns minutos depois Flávio chega eufórico na pick-up, falando milhares de coisas ao mesmo tempo, ele ficou tão satisfeito e feliz que o brilho no olhar e na pele não escondiam esta experiência incrível.

Aqui nos despedimos do espírito empreendedor e aventureiro que é Marcelo Monroy, da linda e delicada Macarena Zapata, que já estão com um grupo de alemães esperando para fazer este circuito de tirolesa que Flávio Prado acabou de fazer e que tanto amou.

Deixamos a Reserva Huilo Huilo certos de que amigos para o resto de nossas vidas encontramos aqui, gente especial que fez parte de momentos mágicos para mim, gente capaz de doar-se ao ponto de te presentear com momentos jamais esquecidos, gente terna e delicada.

Em estrada de rípio com um sentimento de encantamento seguimos rumo à Chillan, onde dormiremos hoje para seguir viagem à Santiago do Chile.

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